Descer a Avenida da Liberdade, banhado pela luz lânguida dos candeeiros, é descobrir, em cada passo noturno, a brevidade de um ato desmedido. As sombras que me acompanham, dialogam, em compassos teatrais, no palco amargo de uma vida que se afaga com os carinhos de um corpo imaterial. O desejo é uma fonte inesgotável de prazeres escondidos que navegam, tranquilos, sobre as águas prateadas do Rio da Alma. Partem em contentores de ficções, em cargueiros que se desvanecem no ócio esbatido do horizonte, entre assombros de partículas sonhadas. Toda esta ventilação sonora pousa sobre o meu olhar, com asas de sono, com o bico da insolência depenicando as amarras que me atracam ao porto da inocência. O que é a noite senão um abraço fleumático de partidas e um arrufo de encontros imaginativos nos fulgores da madrugada. Atravesso a sonoridade urbana por entre as lianas de faróis ébrios e fumego composições de passados que osculam uma dimensão emocional e a carga inédita de uma carga convencional. Nos Restauradores, sou uma maré de sorrisos interiores. Na Estação da Vida, sou um comboio que chega e outro que parte, passageiro, em inversível cor, de um preto e branco que me comove e me adorna com epitáfios de natureza humana. Rumo ao Além, descalçado de memórias, subverto os ouvidos da noite e embebedo-me com as saladas musicais que desencantam, ao mar das tormentas, pedaços de alegrias que o rio engole para que as suas águas tonifiquem a liberdade dos pensamentos que alagam a foz dos dissabores. Sombras desfeitas, a realidade é um pavio que se acende ao comboio das fugas, não de Bach, mas dessa claridade que inventa a sobriedade musculada de uma magia contínua. A vida, que a Lua acende, é uma vela que ilumina e um prazo que a Morte fecunda.❞R Cresppo ☧
Bellaria, 08 de Junho de 2018 - 16:39:17